Adriano
tinha os pés fincados na areia molhada, os músculos das coxas bem marcados, o
contorno do sexo desenhado, com arrogância, sob o calção colado à pele. Os peitorais
pronunciados denunciavam que praticava ginástica e escapava-se-lhe do corpo
atlético uma aura de vigor e energia.
Matilde
estava com o marido na praia; contemplou-o com um misto de arrebatamento e
surpresa. Uma perturbação crescente tomava-lhe o sangue, nublava-lhe os olhos.
Era uma sensação nova, um entorpecimento que a deixava entontecida, num desejo
imenso de embalar num melodioso desvanecer.
Ele abordou
José Pedro. Ela corou, numa súbita vergonha, o coração descompassado. Os olhos
de ambos cruzaram-se; o discreto sorriso que ela esboçou era um sorriso de
resposta ao sorriso encantador que ele lhe enviava. A voz de Adriano era
cálida, máscula, sem ser dominadora. Foi assim que Matilde a ouviu, maravilhada, num misto de terror
e deleite.
Observou-lhe
com mais atenção os olhos claros, a boca bem desenhada, a expressão
desafiadora. Havia nele uma beleza viril que desconhecia no marido; e quando o
ouviu rir, reparou que a gargalhada era fresca. Fixou-lhe extasiada o som do
riso, sentindo que um súbito rubor lhe punha um frémito de Primavera no rosto.
Enquanto
eles falavam, recostou-se na toalha, semicerrou os olhos, num doce torpor, e sentiu a mão dele pousar na sua. Uma mão
quente, firme, vigorosa. Ficou numa agradável modorra, embalada pelo som das palavras
deles. Só se ergueu quando Adriano se despediu, prometendo que os visitaria
brevemente.
Ele
surgiu no restaurante no dia em que a doença foi diagnosticada. Matilde atendeu-o,
bebendo aquele sorriso que era só para ela, com aqueles olhos de água em que
somente os seus olhos mergulhavam e aquele esplendor de luz a irradiar-lhe do
corpo. Ouvia-lhe a voz macia por dentro de si mesma...
Inquirida
sobre José Pedro, entrou em confidências: revelou o drama que desabara nas suas
vidas, o cancro que ameaçava o marido, o sofrimento que essa notícia lhes
trazia.
Adriano
reconfortava-a e tudo passou a ganhar, a partir desse momento, uma dimensão mágica,
como se o mundo despertasse e se enchesse com as palavras de ambos, as
conversas a que se entregavam, as mil pequenas coisas que ela fazia e, ao mesmo
tempo que as fazia, sentia que as
compartilhava com aquele homem que se tornava cada vez mais íntimo. E não
tardou a cair-lhe nos braços...
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in «Um Livro Num Dia», páginas 173-176
Chiado Editora, Abril 2015
Muito bom!
ResponderEliminarmummmmm... a minha imaginação já abstraiu me da realidade...
ResponderEliminarComo sempre, soberbo! O texto e a imagem. ;) As descrições estão para lá da perfeição, arrastando-nos para o cenário. Ainda me faz pecar em pensamento, homem de Deus! Parabéns!
ResponderEliminarObrigado pelos comentários. Devo referir que o regulamento estipulava um limite de 2000 caracteres para este texto, só por isso não o desenvolvi mais. Foi um desafio interessante, mas a história do Adriano e da Matilde não poderia ficar por aí... Desenvolvi-a para outro projecto, ficando com um total de oito páginas A4. O novo texto chama-se «O Susto de Matilde» e será publicado (brevemente) na colectânea «Crime Sem Castigo», da Pastelaria Studios Editora.
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