22 junho, 2018

PRISIONEIROS DO PROGRESSO – PREFÁCIO




PREFÁCIO

  
É com bastante satisfação que assumo, novamente, o papel de editor e torno a prefaciar um livro de Rosa Marques: a sua segunda obra poética, que reflecte fortes preocupações de âmbito social. Se Mar em Mim, o primeiro livro, apresenta temas que lhe são caros e a tocam particularmente a nível pessoal, sendo a maioria dos poemas dedicada à Natureza, às ilhas do seu coração (Madeira e Porto Santo) e ao mar com o qual sempre conviveu, este novo Prisioneiros do Progresso debruça-se sobre questões assaz alarmantes que vão muito além do foro pessoal: afectam todos os seres! Porque Rosa Marques, sendo uma pessoa humana e sensível, é igualmente uma autora atenta, consciente e desassossegada. Preocupa-se com os seus sonhos, com a sua própria vida e a vida dos seus, mas também se inquieta com as vidas e as condutas de outrem... com a sociedade egoísta e materialista em que vive e o mundo cada vez mais mecânico e desumano que a rodeia.
O contacto entre nós estabelecido em 2015 ultrapassou, desde cedo, a mera relação editorial: foi adentrando, de modo crescente, no campo da amizade, gerando-se, de dia para dia, um apreço salutar entre autora e editor construído com pequenas/grandes cumplicidades. Não senti, talvez por isso mesmo, qualquer estranheza quando ela manifestou, alguns meses após ter publicado Mar em Mim, a intenção de editar outro livro de poesia. Não obstante, a temática dos poemas que constituiriam o novo livro deixou-me, numa fase inicial, um tanto apreensivo...
Neste pequeno universo literário em que grande parte das obras poéticas apresentam conteúdos que obedecem (quase) sempre a desejos e anseios de ordem pessoal, editar um livro de poesia totalmente dedicado a assuntos sociais, tecnológicos, ambientais e humanitários pareceu-me uma ideia arrojada, e até arriscada. Não que estes temas não sejam merecedores de atenções reflectidas, também, a nível poético. Pelo contrário: é de louvar! Mas surgiu-me logo uma questão deveras pertinente: quem desejaria adquirir um livro cujos poemas se preocupam, em exclusivo, com as tecnologias que isolam cada vez mais o ser humano e o fazem olhar somente para o próprio umbigo, com as sociedades crescentemente globalizadas, impiedosas e desumanas, resultantes de um progresso acelerado e descontrolado, com toda a humanidade que habita o planeta Terra em perigo? Isto porque, na minha visão de editor, embora privilegie sempre a qualidade das obras literárias, há outros investimentos imprescindíveis à produção de um livro que carecem de retorno, investimentos financeiros, e esse retorno nem sempre poderá ser breve, ou tão breve como se desejaria.
Mas Rosa Marques, expondo-me a sua inquietude e a razão dos temas abordados, logo me tranquilizou. A qualidade dos poemas, aliada à sensibilidade e à simplicidade que a caracterizam, também. São largas dezenas de textos escritos em momentos diferentes, que registam sentimentos de angústia e aflições em diversos períodos da vida da autora, revelando mágoas, descontentamentos e revoltas, não havendo, inicialmente, o objectivo concreto de serem reunidos num livro; em certa altura, porém, a autora constatou que esses mesmos textos poéticos seriam suficientes para formarem um volume. E à medida que chegavam às minhas mãos, para que a obra fosse organizada, convencia-me, cada vez mais, de que este novo livro seria, além de interessante, um excelente desafio/alerta pela via da poesia... e muito oportuno nos tempos que correm! Tal como atestam os versos introdutórios de Prisioneiros do Progresso, o (primeiro) poema que empresta o seu título ao livro: Deslumbrado com o grau de desenvolvimento que já conseguiu atingir / O homem não “sabe”, não quer mais parar... / Egocêntrico, cada vez mais sedento de explorar... de modificar... / Numa sede crescente de progredir... mesmo consciente de que está a destruir...
De acordo com o pensamento da autora e as palavras que me transmitiu, o homem tem causado danos irreversíveis no nosso planeta, que colocam em risco toda a humanidade. Esvaziando-o das substâncias que o tornam equilibrado e habitável, sobrecarregando-o de produtos altamente poluentes e que estão a destruir a atmosfera... dando origem ao aquecimento global, ao efeito estufa, etc. Mesmo consciente de que age mal, ele dá (continua a dar) largas à insensatez. Além de promover um progresso descontrolado que poderá ter consequências nefastas para todos os seres vivos que habitam a Terra, mantém-se indiferente aos danos que desencadeia, ao esgotar, egoisticamente, os recursos naturais do planeta sem pensar nas gerações vindouras. Tudo isso numa ânsia de saciar desejos sem limites, com sede incontrolável de desenvolver, de evoluir sempre e cada vez mais, sem olhar a meios para atingir os fins, e insensível para o inevitável desfecho que poderá ser catastrófico. A situação é alarmante!, frisa a autora. Destruindo o seu próprio habitat, o ser humano caminha a largos passos para o abismo da destruição, da anulação de si mesmo.
No entanto, o homem do século XXI, apesar de todo o desenvolvimento que alcançou, não é feliz. Tornou-se um ser insensível, sem lei, materialista e tecnológico, fruto desse progresso descontrolado que anula os bons valores éticos e morais que regem a vida, descurando a parte espiritual, a mais importante para uma vida feliz e saudável... daí todo o desequilíbrio. Existe uma insatisfação crescente, que ele procura colmatar com mais desenvolvimento... conquistando mais bens materiais. Esta sede desmesurada de poder e de conquista está originando uma cegueira geral para a verdadeira realidade, para o estado em que o mundo se encontra, para a necessidade de se valorizar a vida humana... e menos a parte material. Criando seres insensíveis e indiferentes...
A solidão entre os seres, a falta de afecto, a ausência de valores, as desigualdades sociais, o desprezo pela vida humana, a ambição desmedida, a desordem nas sociedades, as guerras e a pobreza, as alterações climáticas provocadas pela mão humana, enfim, o caos no mundo e a (consequente) desumanização que se tem verificado e acentuado a cada dia são algumas das imensas inquietações bem vincadas nos 67 poemas incluídos neste livro, que remetem, constantemente, para a necessidade de moderar e controlar o desenvolvimento a nível mundial, educando, sensibilizando e consciencializando os seres humanos para uma maior responsabilidade, o que permitirá reduzir os malefícios que a todos afectam.
Sem mais delongas, deixo-lhes nas mãos este Prisioneiros do Progresso, uma belíssima obra poética que, para além do prazer que a sua leitura irá seguramente proporcionar, poderá despertar consciências para certas realidades que nos rodeiam, cumprindo também, desse modo, uma função pedagógica.

Isidro Sousa





Título: PRISIONEIROS DO PROGRESSO
Autora: Rosa Marques
Prefácio: Isidro Sousa
Colecção Sui Generis
Editora Euedito

Editores:
Isidro Sousa (Sui Generis)
Paulo Lobo (Euedito)

ISBN: 978-989-8896-02-5
Depósito Legal: 434950/17
Páginas: 120 páginas




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