01 janeiro, 2016

DE JANEIRO EM JANEIRO


Poema de JORGE MANUEL RAMOS


Sou como um estranho de mim próprio
Vendo o mundo sereno a escapulir-se
Por entre minhas mãos cansadas de rezar
Por alguém, ou pela minha própria mãe
Como ela sempre me ensinou a fazer,
Não sinto saudades, só compaixão
Tudo se perdeu na minha mente,
Viajo num labirinto ingreme e sinuoso
Onde tudo se mistura num ritual
De odor nauseabundo e pecaminoso.

Ah! Como trocaria esta hora
Pelo regresso da minha infância
E esperaria sem preocupação
A hora de celebrar a minha idade
E dar a toda a gente as Boas Festas
Com a mais verdadeira sinceridade,
E como ficaria ali sentado observando
E esperando ser retribuído sem vaidade
Nesse tempo real de Janeiro a renascer
E a progredir em esperanças e cantos.

Ah! Como queria voltar a esse tempo
Sem ver agonia e gente a sofrer
Sem pão, sem dinheiro, sem prantos,
Pedindo e cantando de porta em porta
Apenas e só pela tradição e pelo prazer,
De queimar o ano velho e o Natal
Sem a tradição alterada e adulterada
Naquela quente fogueira do terreiro
Onde o amor e a solidariedade proliferava
E se celebrava de Janeiro em Janeiro.

Ah! Como trocaria esta hora
Pelo regresso da minha infância
E esperaria sem preocupação
A hora de celebrar a minha idade
E dar a toda a gente as Boas Festas
Com a mais verdadeira sinceridade.


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in «Boas Festas», páginas 218-219
Silkskin Editora, Dezembro 2015


NOTA BIOGRÁFICA DO AUTOR
Jorge Manuel Ramos nasceu em 1966, em Seia, e reside em Oliveira do Hospital. Na sua poesia mostra primordialmente as preocupações sociais, facto que a torna interventiva, porém, não relega temas como o amor, a paixão e a observação da natureza. Tem dois livros editados: «As Palavras e a Vida» e «Devaneando». Participa em «Palavras de Veludo» (Orquídea Edições) e «A Bíblia dos Pecadores», uma antologia independente organizada por Isidro Sousa. Publicou este poema («De Janeiro em Janeiro») na antologia «Boas Festas», lançada em Dezembro pela Silkskin Editora.

2 comentários:

  1. É mesmo como descreve na quadra final... revejo-me nessas palavras. O Natal tem outro encanto quando somos crianças. Muitos parabéns, gostei muito. E parabéns ao Isidro por partilhar, ou ainda não tinha lido o seu poema. Bom ano para todos.

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