PREFÁCIO
O Carnaval é um período de festas profanas
que ocorre entre os Reis e a Quaresma, com o seu auge nos três dias anteriores
à Quarta-feira de Cinzas, especialmente na terça-feira que antecede o primeiro
dia da Quaresma. De todas as celebrações cíclicas anuais, esta é a mais
grandiosa e uma das poucas manifestações que consegue envolver todo o público,
apresentando maior riqueza de aspectos, grande variedade de elementos e uma
característica complexidade de significações.
A sua
história começa na Antiguidade, com as festas de culto à deusa Ísis, no Antigo
Egipto, e eventos relacionados com acontecimentos religiosos e agrários, embora
também haja indícios de que tenha origem em festas pagãs e rituais orgíacos. Os
romanos, os gregos e os egípcios davam as boas-vindas à Primavera com
cultos de fertilidade, rituais de abundância para a agricultura e celebrações
fartas, consagradas aos respectivos deuses. Alguns advogam o culto de Ísis,
outros as festas em honra do deus Dionísio e outros as bacanais, lupercais e
saturnais, festejos romanos de grande licenciosidade em que havia uso de
máscaras.
Na
Grécia clássica, as primeiras seguidoras de Dionísio eram mulheres que escapavam,
nos dias que lhe eram dedicados, da vigilância dos maridos, pais e irmãos, para
caírem na folia com “danças furiosas e gritos de júbilo”. Nesses dias, saíam
aos bandos, com os rostos cobertos de pó e vestes transformadas ou rasgadas,
cantando e gritando pelas montanhas. Os homens, transfigurados em silenos e
sátiros, não tardaram a aderir às procissões femininas e ao “frenesim
dionisíaco” e a festança, que durava três dias, encerrava com uma bebedeira
colectiva no meio de um “vale-tudo” pan-sexualista. As autoridades (as cortes,
os sacerdotes e os ricos) não gostaram desses festejos malucos porque, entre
outras razões, eram as vítimas favoritas das sátiras; tentaram reprimi-los. Além
de serem uma teatralização colectiva da inversão de tudo, os festejos serviam
como um acerto de contas do povo com os seus governantes, ainda que metafórico
e psicológico. Neles, o miserável vestia-se de rei, o ricaço de pobretão, o
libertino aparecia como guia religioso, a rameira posava como a mais pura
donzela, machos vestiam-se como fêmeas e assim por diante. Dionísio,
irreverente e debochado, estimulava que virassem o mundo de cabeça para baixo.
A tentativa de repressão fracassou e Pisístrato oficializou as homenagens a
Dionísio na Grécia, sendo nesta altura (século VI a.C.) que se instaurou o
chamado Carnaval Pagão.
Outra
hipótese difundida entre pesquisadores é a de que o Carnaval tenha iniciado em
Itália, com o nome de Saturnálias – em homenagem a Saturno, a Baco (o Dionísio
romano) e a Momo. Saturno, deus da agricultura dos romanos, identificado como
Cronos pelos gregos, pregava a igualdade entre os homens e ensinou a arte da
agricultura. As comemorações, que se prolongavam por sete dias e incluíam
bacanais, realizavam-se nas ruas, praças e casas da Antiga Roma e havia uma
aparente quebra de hierarquia social quando todos se misturavam na praça pública.
A separação da sociedade em classes fazia que houvesse a necessidade de
válvulas de escape, através de sexo e bebida. Os festejos revestiam-se de tal
importância que todas as actividades e negócios eram suspensos nesse
período: tribunais e escolas fechavam as portas durante o evento, os escravos
ganhavam liberdade temporária e as restrições morais eram relaxadas. As pessoas
dançavam e trocavam presentes, um rei era eleito por brincadeira e comandava o
cortejo pelas ruas e as tradicionais fitas de lã que amarravam aos pés da
estátua de Saturno eram retiradas, como se a cidade o convidasse para
participar na folia.
Corridas de cavalo, desfiles de carros alegóricos, brigas de papelinhos,
lançamentos de ovos e outros divertimentos generalizavam a euforia. Na abertura
dessas festas ao deus Saturno, carros com aparência de navios surgiam na
“avenida”, com homens e mulheres nus – estes eram chamados os carrum navalis, para muitos a origem da
expressão carnevale.
Embora haja
muitas teorias sobre a origem do Carnaval, numa ideia todas elas convergem: a
transgressão, o corpo, o prazer, a carne, a festa, a dança, a música, a arte, a
celebração, a inversão de papéis, as cores e a alegria fazem parte da matriz
genética de uma das manifestações populares mais belas do Mundo, que foi
frequentemente alvo da repressão de quem não tolerava a subversão de um mundo
virado do avesso. A opinião de historiadores sobre o Carnaval não é unânime,
tanto em relação à data do seu surgimento como à origem da própria palavra
“Carnaval”. Há efectivamente duas correntes distintas nesta abordagem, que se baseiam
em duas oposições presentes nas actuais celebrações do Carnaval.
A
primeira é a oposição entre a ordem e a desordem, entre o mundo visível e quotidiano
e as pulsões inconscientes, entre a representação e a vontade, entre o mundo
que vemos e o mundo visto de cabeça para baixo. Nesta linha, a palavra
“Carnaval” teria origem no vocábulo latino carrum
navalis, os carros navais que faziam a abertura das Saturnálias e das Dionísias
Gregas nos séculos VII e VI a.C. e onde a euforia e a inversão de valores se
estendiam pelas ruas das cidades. A segunda oposição, com origem nitidamente
cristã, é entre o Carnaval e a Quaresma, ou entre a Terça-feira de Carnaval e a
Quarta-feira de Cinzas, que marca a entrada na Quaresma. A palavra terá surgido
quando o início da Quaresma foi transferido para a quarta-feira (sendo a
terça-feira legitimamente a noite do Carnaval) antes do sexto domingo que
precede a Páscoa. Ao domingo anterior deu-se o título de dominica ad carne levandas, expressão que se abreviou
sucessivamente para carne levandas, carne levale, carne levamen, carnevale
e carnaval, todas variantes de
dialectos italianos e que significam acção de tirar, isto é, “tirar a carne” ou
“adeus à carne”.
Com
o advento da era cristã, a Igreja Católica começou por tentar conter os
excessos do povo nestas festas pagãs e uma solução foi incluí-las no calendário
religioso. Então, o Carnaval Cristão passa a existir quando a Igreja (em 590
d.C.) oficializa a festa. Antes, a instituição condenava os festejos pelo seu
carácter “pecaminoso”. A civilização judaico-cristã fundamenta-se na
abstinência, na culpa, no pecado, no castigo, na penitência e na redenção,
renegando e condenando o Carnaval. Não obstante, as autoridades eclesiásticas
da época viram-se num beco sem saída dada a força e espontaneidade das
celebrações. Foi aí que houve a imposição de cerimónias oficiais “sérias” para
conter a “libertinagem”. No entanto, é só em 1545, no Concílio de Trento, que o
Carnaval é reconhecido como uma manifestação popular de rua. A Igreja Católica,
que considerava tais festejos mundanos, decidiu adoptar essas festas de origem
pagã e obscena, transformando-as em libertárias na tentativa de domesticá-las. E
determinou que fossem promovidas na véspera do início da Quaresma, como uma
espécie de compensação para o período de jejum e abstinência que antecede a
Páscoa, momento em que os cristãos comemoram a ressurreição de Cristo, a
vitória da vida sobre a morte. Assim, o Carnaval ficou sendo uma festa que
termina em penitência na Quarta-feira de Cinzas. Os cristãos iniciavam as suas comemorações
no fim de Dezembro, compreendendo os festejos do Natal, do Ano Novo e dos Reis,
onde predominavam os jogos e os disfarces. Mas estas acentuavam-se no período
que antecedia a Terça-feira Gorda, o último dia que se comia carne antes do
jejum da Quaresma, durante o qual também havia, tradicionalmente, a abstinência
de sexo e até mesmo das diversões, como circo, teatro ou festas. Desse modo, a origem
da palavra “Carnaval” estará, igualmente, relacionada com a ideia de “festa do
adeus à carne” e marcada pela junção de duas palavras latinas como carnis (carne) e valles (prazeres) ou carnis
(carne) e levale (retirar).
Após
o Concílio de Trento, a Igreja considerava o Carnaval pecaminoso somente em
círculos restritos, como a Corte Francesa anterior à revolução, onde os bailes
de máscaras se transformavam em bacanais. Não entre o comum do povo entregue a
ingénuos bailados e banhos de cheiros, revelando o vigoroso e sadio espírito de
festa, a culminar nos cortejos expressando não só o pitoresco, mas
frequentemente a crítica aos costumes e aos poderosos. Como a Igreja proibira
as manifestações sexuais no festejo, novos divertimentos adquiriram forma:
corridas, desfiles, fantasias, deboche e morbidez. Estava o Carnaval reduzido à
celebração ordeira, de carácter artístico, com bailes e desfiles alegóricos.
No Renascimento,
as festas carnavalescas passam a incorporar os bailes com as suas ricas
fantasias, os carros alegóricos e os corsos – o baile de máscaras é introduzido
no século XV, mas ganha força e tradição no século seguinte, por causa do
sucesso da Commedia dell’Arte. O
Pierrô, a Colombina e o Arlequim datam dessa época, tendo origem na Comédia
Italiana, companhia de actores que se instalou na França para difundir a Commedia dell’Arte. As mais famosas
máscaras confeccionam-se em Veneza e Florença, muito utilizadas pelas damas da
nobreza a partir do século XVII como símbolo máximo da sedução, verdadeiras
peças de arte indispensáveis à libertinagem dos burgueses. Os
excessos continuam associados aos festejos; não obstante, a Igreja Católica
absolve-os de pecado e autoriza os fiéis a disfrutarem dos prazeres da carne,
pois tudo será perdoado a seguir – desde que cumpram com rigor os quarenta dias
de jejum da Quaresma, a purificação do corpo e da alma estão garantidos.
E assim se manteve o Carnaval até ao século
XIX, quando adquiriu outro vigor. Perdia em festa “bufa” e de rua, ganhava em
elegância, alegoria, ordem e requinte artístico, além de tocar agora as classes
mais abastadas, antes arredadas dos festejos populares. Na Europa Ocidental, bailes
e desfiles organizados tomavam o lugar das turbas de gente etilizada e aos
gritos. Este novo Carnaval europeu sobrevive ainda hoje; aliás, o Carnaval
moderno, feito de desfiles e fantasias, é produto da sociedade vitoriana do
século XX e a cidade de Paris foi
o principal modelo exportador desta festa para o Mundo. Cidades como Nice, Nova
Orleans, Toronto e Rio de Janeiro inspiraram-se no Carnaval parisiense para implantar
as suas novas festas carnavalescas. Já o Rio de Janeiro criou e exportou o estilo de fazer Carnaval
com desfiles de escolas de samba para
outras cidades do Mundo, como São Paulo, Tóquio e Helsínquia.
Um
dos principais rituais de Carnaval na Europa que se deve salientar é o Entrudo.
Esta palavra vem do latim, significa introdução à Quaresma e existe desde que o
Carnaval Cristão foi oficializado. O povo comemorava, comendo e bebendo, para
compensar o jejum, mas o ritual tornou-se, aos poucos, bruto e grosseiro,
atingindo o máximo de violência e falta de respeito em Portugal, no século XVI,
quando um homem do povo atirou uma “laranjada” a um nobre. Nessa época,
atiravam água suja e ovos das janelas e dos balcões, nas ruas havia guerra de
laranjas podres e restos de comida e cometia-se todo o tipo de abusos e
atrocidades. Foi assim que a festa de Carnaval chegou a Portugal, recebendo o nome de Entrudo,
através de uma brincadeira agressiva. O evento tinha uma característica
essencialmente gastronómica e era marcado por um divertimento violento, cujas
partidas incluíam brigas e vassouradas, baldes de água (e de outras coisas)
despejados das janelas, lixo arremessado, cal esfregada nas roupas e nos
cabelos, escadas ensaboadas à espera do trambolhão; faziam-se esferas de cera com o interior
cheio de água-de-cheiro que eram atiradas aos transeuntes e os mais ousados
começaram a injectar, no interior das “laranjinhas” ou “limões-de-cheiro”,
substâncias malcheirosas e impróprias, o que fez que a festa fosse perdendo a
sua alegria. No entanto, estas práticas foram proibidas e o Carnaval
entrou na ordem dos cortejos, nas batalhas das flores e nos salões de baile.
Em
finais do século XIX, nas aldeias portuguesas, o Entrudo era um momento de
transgressão calendarizada e aceite por todos: uma catarse de pulsões, a purga
necessária ao regresso à ordem, um momento de igualdade e de liberdade para
todos, aceite pelos poderosos. Nas cidades, o Carnaval transformou-se numa
forma de “luta de classes”, com uma insolência e irreverência (e montras de
lojas partidas) que assustavam os burgueses. Todavia, os exageros do Carnaval
urbano foram regulamentados e domesticaram-se os festejos, com a criação dos
desfiles.
Dentre
as comemorações características de cada região, um especial destaque para as
máscaras dos Caretos e os próprios Caretos. São máscaras assustadoras, misteriosas
e fascinantes, que andam à solta no Inverno transmontano, uma tradição que tem
raízes milenares e transforma pacatos rapazes em diabos, chocalheiros,
zangarrões e caretos, que afugentam e animam aldeias inteiras e os forasteiros
que lá vão só para as ver. Os preparativos para os dias de festa começam antes
do Inverno chegar ao Nordeste português. Os artesãos trabalham a madeira, o
cabedal, o latão, a lã. Aos poucos aparecem as caras e os fatos que vão
esconder a identidade dos rapazes. Assim, temíveis e divertidos, os mascarados
quebram a rotina do quotidiano rural. O disfarce é a chave destes rituais que
anunciam um novo ciclo: na Natureza e na vida dos homens. Os mascarados
transmontanos simbolizam a vida que se renova na Primavera, a entrada num tempo
fecundo e próspero, a passagem da puberdade à idade adulta. A comunidade
revitaliza-se e reforça laços nestas festas organizadas pelos rapazes. De
chocalhos à cintura e vara na mão, eles têm o diabo no corpo – correm, saltam,
dançam, perseguem as raparigas solteiras, intimidam os visitantes. A brincar a
brincar, este Carnaval recicla tradições e enche de orgulho o povo aldeão,
cujas festas de Domingo Gordo e do dia de Carnaval são da inteira
responsabilidade dos Caretos, seres mágicos que vivem nas máscaras e nos trajes
exuberantes, que invadem as ruas da aldeia para expurgar os males e purificar.
E, claro está, para dar umas “chocalhadas” nas raparigas casadoiras. Esta forma
de celebrar o Carnaval, que é hoje uma atracção turística, vem do tempo dos
romanos, embora alguns autores reportem as festividades ao período do
Neolítico.
Além
dos Caretos, outros foliões como Cabeçudos e Matrafonas continuam de
pedra e cal no Carnaval lusitano. Mesmo em tempo de crise, o espírito de festa
mantém-se vivo, as tradições carnavalescas são cumpridas à risca, razão pela
qual a expressão “a vida são dois dias e o Carnaval três” soma e segue ao mesmo
ritmo com que se preparam os festejos em várias regiões do País. Sempre com a
alegria e o simbolismo próprio desta época. De Norte a Sul, são diversos os
cortejos, as máscaras e os bonecos que respeitam a tradição, enchendo as ruas
de cor e fantasia. Organizam-se os corsos, enfeitam-se bonecos e importa-se o
samba do Rio de Janeiro, mas nem por isso perdemos a nossa identidade cultural.
O Carnaval de Torres Vedras, por exemplo, é
considerado “o Carnaval mais português de Portugal” e não tem espaço para
introduzir hábitos ou costumes oriundos do estrangeiro. Tudo leva a crer que as
suas facécias tenham emergido no rescaldo da luta dos Republicanos contra a
dinastia dos Braganças, no início do século XX. A imponência das vestes reais,
que integram elementos de ridículo como o ceptro régio transmudado em corno ou
o leque de Sua Sereníssima Alteza, a Rainha, alterado para abano de fogareiro
plebeu, parecem credibilizar esta génese. A festa mantém-se fiel às tradições
que a popularizaram na rua, desde 1923, altura em que se fez a recepção ao Rei
e ao qual se juntou, um ano depois, a figura da Rainha. O modelo dos Reis do Carnaval
ainda hoje persiste, mas fazendo jus às sátiras sociais e políticas, à base de
caricaturas de personalidades públicas, é composto por duas figuras masculinas,
uma delas trajada de Rainha. O centro da cidade serve de palco a brincadeiras,
aos corsos nos quais participam os carros alegóricos, de grandes dimensões, Matrafonas
(homens vestidos com roupas de mulher), Cabeçudos (bonecos gigantes), grupos de
desfile e os Zés Pereiras, terminando com o enterro do Entrudo – condenação do Rei
– e fogo-de-artifício.
O
Carnaval brasileiro, por sua vez, tem origem no Entrudo português e surgiu com
as primeiras caravelas da colonização. Mais precisamente: o Entrudo desembarcou
no Brasil no século XVI, com a chegada de portugueses das ilhas da Madeira,
Açores e Cabo Verde, e a principal diversão dos foliões era atirar água uns aos
outros. Tal como em Portugal, era uma festa cheia de inconveniências, na qual
participavam tanto os escravos quanto as famílias brancas. Após insistentes
intervenções e advertências da Igreja Católica, substituíram os banhos de água
suja por limões de cheiro, esferas de cera com água perfumada ou água de rosas
e bisnagas cheias de vinho, vinagre ou groselha. Esses frascos deram lugar ao
lança-perfume, bisnaga ou vidro de éter perfumado de origem francesa.
No final do século XVIII, o Entrudo era já praticado em todo o
território de Vera Cruz. Embora muitos da elite na Corte Imperial o considerassem
uma festa suja e violenta, a maioria dos senhores libertava os escravos para a
folia, cujas brincadeiras e folguedos variavam conforme os locais e os grupos
sociais envolvidos. Com a mudança da Corte Portuguesa para o Rio de Janeiro,
surgiram as primeiras tentativas de civilizar a festa carnavalesca no Brasil,
através da importação dos bailes e
dos passeios mascarados parisienses, colocando o Entrudo popular sob forte
controlo policial. A partir de 1830, sucede-se uma série de proibições na
tentativa, sempre infrutífera, de acabar com a festa grosseira.
O
evento brasileiro recebeu também muitas influências das fantasias e máscaras
italianas, que começaram a ser difundidas no século XIX, e só no século XX é
que recebeu elementos africanos, considerados fundamentais para o seu
desenvolvimento. Com essa mistura de costumes e tradições tão diferentes, o
Carnaval do Brasil é, presentemente, um dos mais famosos do Mundo e atrai imensos
turistas dos cinco continentes.
Os
primeiros grandes clubes carnavalescos no Rio de Janeiro surgiram em 1855.
Outro importante movimento foi o dos cordões, nascido em 1885, que originou os
blocos e, mais tarde, as escolas de samba – é a primeira manifestação de Carnaval
influenciada pela cultura e religião africana, formada por negros, mulatos e
pessoas humildes, que saíam às ruas animando o povo ao som de instrumentos de
percussão e músicas compostas especialmente para os desfiles comandados pelo
apito do mestre que estava sempre à frente dos músicos. No início do século XX,
já diversos cordões e blocos desfilavam nas cidades. A primeira escola de samba
foi fundada em 1928, no Rio de Janeiro; a Praça Onze, nesta cidade, tornou-se no
local mítico de concentração das escolas nos dias de Carnaval, incentivando, de
ano para ano, o aparecimento de novas escolas, que foram surgindo até chegarem
à grande festa que se vê hoje e faz do Carnaval uma das maiores manifestações
populares do Brasil. Actualmente, existem outras formas de Carnaval por todo o
País, como o da Bahia, de tradição africana e com sonoridades e ambientes diferentes
do do Rio de Janeiro (veja-se o cortejo dos Afoxés), ou os de Olinda e Recife,
igualmente animadíssimos e marcados pelas músicas de ritmo frenético e
contagiante, em batidas sincopadas a par de instrumentos de sopro. E o frevo,
uma “combinação de canto, toque e dança”, classificado como património
imaterial da cultura brasileira, domina ainda o Carnaval de alguns estados do
Nordeste, como Pernambuco e Paraíba. Quanto às escolas de samba, são hoje
autênticas empresas de espectáculos e há regras próprias dentro delas, quer de
admissão, quer de permanência, quer de actuação dentro de um desfile de
Carnaval. Porém, são elas que mais animam o evento carnavalesco, atraindo uma
miríade de colaboradores ao longo do ano e um frenesim inusitado na época do Carnaval.
Posta esta explanação, para que possamos ter
algumas noções sobre a história do Carnaval ao longo dos tempos, e pegando numa
das imensas expressões populares – É
Carnaval, ninguém leva a mal – organizámos esta obra colectiva, para a qual
se seleccionaram três dezenas de estórias de trinta autores lusófonos,
ambientadas ou inspiradas no Carnaval, e estão presentes, entre elas, dois
textos que ocorrem no Halloween, já que este é considerado um “Carnaval fora de
época” em algumas comunidades. Ordenadas alfabeticamente a partir dos nomes dos
autores, são estórias totalmente distintas entre si, cujos registos variam do
drama à comédia, da aventura ao romance, passando pela fantasia, sobrenatural e
biografia, ou seja, incluem um pouco de tudo, independentemente das sensibilidades,
culturas, experiências de vida e estilos dos seus autores. Alguns foram já distinguidos em concursos literários e
certames similares, conquistaram prémios e menções honrosas e têm livros
individuais editados, e outros continuam a fazer a estreia literária numa edição
Sui Generis; as suas biografias (resumidas) estão incluídas no apêndice desta
antologia.
Boas leituras!
Isidro Sousa