PREFÁCIO
Redijo com imensa
satisfação este texto para prefaciar Mar
em Mim, o primeiro livro de Rosa Marques. Conheci esta autora no segundo
semestre de 2015, por intermédio da Internet,
na mesma altura em que eu organizava a obra inaugural da Colecção Sui Generis.
Uma simples manifestação de interesse em participar na antologia A Bíblia dos Pecadores gerou diversos contactos
através das redes sociais e a comunicação entre nós foi-se desenvolvendo. Com o
decorrer dos meses, surgiria uma amizade plena de muita cumplicidade. Pude,
então, conhecer melhor a escrita desta autora, à medida que recebia (novas)
participações para outras obras colectivas. Além disso, ela passou a mostrar-me,
também, textos destinados a projectos de outras editoras, para que os pudesse rever.
Era raro o dia em que não me
abordava pelo Facebook com um “bom dia”, “boa noite” ou “bom fim-de-semana”. E
a troca de opiniões tornou-se uma constante. Foi assim, de dia para dia, que
fui conhecendo a essência de Rosa Marques. Pude vislumbrar não só o incrível ser
humano que ela é, mas também familiarizar-me, de modo crescente, com a
sensibilidade e a delicadeza que impregnam a sua escrita. Quer na prosa, quer
na poesia. Sim, na prosa e na poesia... porque esta autora madeirense move-se
com bastante à-vontade tanto no universo da prosa como nas ondas da poesia.
Daí a trocarmos ideias
sobre a possibilidade de ela editar um livro (individual) foi um passo. E, na
parte que me toca, confesso: após ter firmado as primeiras antologias com o
selo Sui Generis, era meu objectivo evoluir para a publicação de obras
individuais. De minha autoria e não só. A Rosa Marques foi amadurecendo, igualmente,
o seu desejo, até que a decisão fosse tomada. Vencido o impasse sobre o género
literário que marcaria a sua estreia (prosa, poesia ou um livro infantil),
optou por uma obra poética – este livro que se acha nas vossas mãos: Mar em Mim.
E porquê uma obra que
reúne 73 poemas dedicados, maioritariamente, à Natureza, às ilhas que a viram
nascer e crescer (Madeira) e onde reside e trabalha até à data presente (Porto
Santo) e também ao mar que a rodeia – com o qual sempre conviveu?
Porque Mar em Mim resulta de um conjunto de
emoções sentidas perante a beleza dessas duas ilhas banhadas pelo Atlântico e o
fascínio que o mar e a Natureza exercem (sempre exerceram) na autora. Emoções
apreendidas desde a mais tenra idade... quando ela interrompia, durante a sua infância
vivida junto à Natureza, as brincadeiras ao ar livre para contemplar o
pôr-do-sol e o deslumbramento das árvores recortadas no horizonte em ouro.
Nessa época, Rosa Marques
nada sabia ainda sobre os fenómenos da Natureza, porém, aqueles castelos de
nuvens luminosas e alaranjadas que se transformavam pouco a pouco, atraindo
novas formas e cores, cativavam o seu olhar. Um fascínio que se manteria pela
vida fora, até aos dias de hoje. Mas não só...
A diversidade (e beleza)
das flores e de árvores como os pinheiros altos, os plátanos, as acácias e as
giestas em flor alegraram, igualmente, a sua infância. E o canto dos pássaros,
a Lua formosa e altiva, as mudanças operadas na paisagem em cada estação (cada
uma com a sua singularidade e a sua doçura) e o mar sempre presente... O mar
como elo fundamental para quem vive nas ilhas, sendo necessário transpô-lo para
vencer as encostas íngremes da solidão. O mar amigo que fascina e atrai, mas
também o mar adverso, condicionando e interpondo-se com toda a sua imponência,
que é preciso respeitar.
Todas estas vivências
acompanharam a vida da autora como a melhor das recordações. Uma vida inteira
passada entre as (suas) duas ilhas. Inicialmente, na Madeira, onde viveu até
aos dezoito anos de idade; posteriormente, em Porto Santo, para onde se mudou
após o seu casamento. Da necessidade de registar essas lembranças surgiram os
poemas incluídos neste livro, que Rosa Marques, incentivada por familiares e
pessoas amigas, decidiu publicar.
Mas os textos poéticos aqui
apresentados não se debruçam somente sobre o mar, as ilhas e a Natureza.
Reflectem também outras situações que preocupam a autora, tais como a
instabilidade no mundo e as desigualdades sociais, especialmente as crianças indefesas
que sofrem todos os tipos de privações e maus tratos.
Com tão variados temas, como
organizar, então, estes poemas? Optou-se pela linha das quatro estações do ano,
espalhando-os ao longo da obra. Desse modo, podemos encontrar, nas páginas iniciais,
além daquele que fornece o título ao livro e de outros que abordam os temas
predominantes, alguns mais sobre crianças (Menino
que dorme) e as diversas fases do dia (Na
claridade difusa da manhã, Fim de
tarde à beira-mar, A cidade veste-se
de luar, etc). Prosseguem textos primaveris na sequência de meses
relacionados (Abril em flor, por
exemplo), mesclados com a ambiência da mesma estação, sem olvidar os sentimentos
do coração que adquirem maior visibilidade à medida que o Verão se aproxima. E
as ilhas sempre lá. E o mar também. Tal como as crianças, que muito
sensibilizam a autora (É Verão! / Há sol,
há cor e alegria! / À beira-mar é grande a azáfama, / a euforia... / Das
crianças que brincam / falam alto, riem e gritam... / As ondas inquietas vão e
vêm / com elas também brincam!).
Nas páginas subsequentes,
ganham força outras temáticas... temas nostálgicos... a música que inebria (Música como bálsamo / libertando da solidão!),
o amor e a solidão marcando presença, enquanto se vão sentindo os primeiros Ventos outonais. E igualmente a situação
daqueles que vivem em condições precárias, o valor da amizade, os livros e a
importância da leitura nas nossas vidas.
Particularmente tocantes,
já na derradeira estação: o poema dedicado “aos que vivem nas terras áridas
onde nada sobrevive devido à seca, como em África, onde todos os dias morrem
pessoas à fome” ou Carta ao Pai Natal,
que pede “um pouco de conforto” para todas as crianças do mundo. É com estes
textos menos “calorosos”, embora não menos sensíveis e humanos, que se vai pintando
uma Paisagem de Inverno, em que os
temas principais – o mar, as ilhas e a Natureza – se mantêm vincados até à
última página.
Poderia desvendar um pouco
mais sobre Mar em Mim, esta belíssima
obra poética que marca a estreia literária de Rosa Marques. No entanto, reservo
aos leitores as emoções que estes 73 poemas despertam; tudo o que faz bem à
alma, o que encanta e toca ao coração, a mensagem que cada texto transmite...
Isidro Sousa
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